quinta-feira, 16 de setembro de 2010
AFOXÉ
Está na língua iorubá a fórmula verbal para se entender o significado da palavra afoxé:
a, prefixo nominal;
fo, verbo- pronunciar, dizer;
xé, realizar-se, verificar-se
A fórmula revela-se na tradução literal de Antônio Risério, segundo a qual afoxé quer dizer: a enunciação que faz (alguma coisa) acontecer. Risério cita Olabiyi Yai, para quem afoxé, "em iorubá, significa, pois, encantamento, palavra eficaz, operante". Propõe Risério uma tradução mais poética: afoxé seria, então: "a fala que faz".
De forma diversa, o musicólogo e maestro Guerra Peixe, no seu clássico "Maracatus do Recife", assinala que o vocábulo deriva do sudanês ÀFOHSHEH e lembra que se trata de um "remoto designativo" do maracatu. Relata Guerra Peixe que ouviu, em um maracatu recifense, referências à expressão "Afoxé de África" e que, na Bahia, o vocábulo indica a espécie de Maracatu salvadorense e nomeava, como explica Arthur Ramos, "as festas profanas dos terreiros baianos". Garante Guerra Peixe que "a palavra apareceu no Recife, certamente, em virtude da influência religiosa que os sudaneses exerceram sobre os bantos." Distingue ele os termos Nação, designativo do grupo administrado por governador negro, e afoxé o afoxé de África, a festa profano-religiosa efetuada pela nação no momento oportuno. A expressão afoxé teve uso restrito, apenas entre os seus participantes, já que os autores dedicados ao estudo do maracatu não a registram.
Katarina Real se refere a um dos seus "informantes mais idosos sobre o maracatu, Seu Veludinho", como alguém que "se lembra ter ouvido frequentemente no Recife, no passado, a palavra afoxé com referência aos maracatus". Ele insiste - diz Katarina - que o nome maracatu "foi invenção dos homens grandes ... maracatu nem tinha nome de maracatu. O nome era Nação. Na palavra africana, é Afoxé de África".
Cantigas para todos
INSTRUMENT0S
Afoxé (ou Agbê) - Cabaça coberta por uma rede formada de sementes ou contas. O agbê é percutido agitando-se a rede, que fricciona no corpo da cabaça.
Atabaques - São basicamente de três tipos, com três tamanhos diferentes que em conjunto traduzem o som do ijexá, tocado no afoxé atualmente.
Agogô - Formado por duas campânulas de metal, com sonoridades diferentes. O agogô é quem dita o ritmo aos demais instrumentos.
VOCAL
As melodias entoadas nos cortejos dos afoxés, afirma Raul Lody - são praticamente as mesmas cantigas ou orôs entoados nos terreiros afro-brasileiros que seguem a linha jexá. E acrescenta: "os orôs são puxados em solo e em seguida repetidos por todos, inclusive pelos instrumentistas. Geralmente quem realiza o solo é uma pessoa de status elevado dentro do grupo". Afoxé, longe de ser, como muita gente imagina, apenas um bloco carnavalesco, tem profunda vinculação com as manifestações religiosas dos terreiros de candomblé, "já que seus praticantes estão fundamentalmente ligados ao culto dos orixás", como declara o antropólogo Raul Lody. Vem daí o fato de chamar-se o afoxé, muitas vezes, de "Candomblé de rua". Inclusive por homenagear um orixá, geralmente, o orixá da casa de candomblé a que pertence. Em Pernambuco, o afoxé ressurge com o Movimento Negro Unificado no final da década de 70, como uma das formas de se fazer chegar à maioria da população, o debate sobre consciência negra e liberdade, através da música.
Atualmente existem quatro grupos de afoxé em avançado estágio de organização, são eles: O Araodé, Alafin Oyó, e o Oxum Panda, todos na cidade de Olinda. No Recife, Afoxé Ilê de Egbá, com sede no Alto José do Pinho.
O afoxé irradia o axé dos cânticos e das músicas de quem compõe e participa da expansão de seu som.
As mensagens que aludem à trajetória da luta de liberdade pelos direitos de territorialidade, cantadas em yoruba ou no português dos antigos africanos, atualiza num aqui e agora, a alegria e o prazer de pertencer ao afoxé.
Mãe Senhora, Iyalorixá Oxun Muiwa e Iyanassô, esse título recebido do Alaafin Oyó, rei de Oyó, a capital política do reino nagô-yoruba onde Xangô é o orixá patrono, demarcava a territorialidade de seus poderes com a frase “Da porteira para dentro; da porteira para fora”, querendo destacar a soberania absoluta da tradição que assegura a continuidade do axé, dos ilê axé das casas de axé.
Se por um lado no que se refere à liturgia, aos preceitos rituais, os poderes hierárquicos da tradição são absolutos, no que se refere às ações projetadas para fora, elas entram em espaços de luta e afirmação.
É aqui nesse contexto que se situam os afoxés, cujas armas são a estética do encantamento, composta de beleza e alegria; valores da linguagem da tradição nagô se espraiando pelo espaço urbano do carnaval.
Nas vilas e cidades nagô-yoruba na África é comum festivais religiosos acontecerem em espaços públicos. As entidades desfilam acompanhadas pelo povo em procissão, como o culto Gelede dedicado às Mães Ancestrais, em Ketu; festivais do culto aos Egungun, os Baba Egun, os ancestrais masculinos, em diversas cidades do antigo império yoruba; a famosa procissão do Ataojá ao rio Oxun, para as oferendas ao rei Laro, ancestral fundador da cidade de Oshogbo onde Oxun é o orixá patrono, ocasião em que ocorre a visita de vários reis vizinhos que reforçam os laços de amizade; o festival Epa em Ekiti, onde ocorre um cortejo de entidades que proporciona a elaboração da saga da humanidade, na presença das maiores autoridades locais, dentre muitos e muitos outros cortejos.
No Brasil, num contexto histórico adverso para manter viva essas tradições africanas dos cortejos, eles acontecem em meio a certas referências católicas como a procissão da sociedade de Nª. Senhora da Boa Morte, em Cachoeira (BA);, a famosa Lavagem do Bonfim, em Salvador-BA e tantas mais, sem mencionarmos outras referências africano-brasileiras como os cortejos dos Maracatus, em Pernambuco; as Congadas, de Minas Gerais; a coroação dos reis e rainhas do Congo, espalhadas pelo País.
O carnaval abre possibilidades de novos embates para ocupação do espaço público. Algumas instituições se deslocam estrategicamente do espaço das referências católicas para o carnaval, como, por exemplo, os Maracatus.
O afoxé “Troça Carnavalesca Pai Buruko” foi fundado em Salvador (BA), por Deoscoredes Maximiliano dos Santos – Mestre Didi Alapini – descendente da tradicional linhagem Asipa, na roça do Ilê Axé Opo Afonjá, no tempo da inesquecível Mãe Aninha – Iyalorixá Oba Biyi – nos fins da década de 1930. Ele e mais alguns amigos seguiram as orientações da avó Aninha e, depois de algumas tratativas, foi criado o “Pai Buruko”.
Afoxé é palavra da língua yoruba composta de duas outras palavras, “afo”, que é sopro, hálito que acompanha a emissão da palavra pronunciada, de quem a pronuncia; e “axé”, que em geral se traduz por força espiritual, força emanada de uma visão sagrada de mundo.
Desse modo o afoxé irradia o axé dos cânticos e das músicas de quem compõe e participa da expansão de seu som. A levada das mensagens dos integrantes do grupo carnavalesco se faz através do ritmo ijexá, que é característico de Oxun, patrona da música.
Os instrumentos são basicamente pequenos tambores ou atabaques, os agogôs, os xekerés e, ainda, na partida, também os clarins para a execução do hino.
Antes de mais nada, porém, para que as mensagens sejam bem recebidas e tudo ocorra bem, são feitos os preceitos necessários às entidades, para que protejam e abram os caminhos por onde circulará a Troça...
O “Pai Buruko” canta e dramatiza os valores e os desejos de liberdade de sua gente afirmando, desde suas vestimentas, o cabedal de herança do contínuo civilizatório africano e as estratégias da luta de reposição e afirmação existencial no contexto em que acontece.
O afoxé possui alguns momentos característicos após o hino: afirmações e reivindicações, como nos versos:
”jiribumbum, qui tera é nossa”,
“visitá governadô prá esse vida miorô”
A dramatização do “oluô” que brinca com os assistentes “jogando búzios”:
“aile aila Buruko já vai jogá”
A “fuga”
“pai Buruko soldadevém”
“entra em beco sái in beco”
As brincadeiras ao som do ijexá ou do samba de roda:
“o samba aqui tava bão gente de fora chego trapaiô”
As despedidas:
“minha gente vam simbora qui o vapo já suviô essa gente anda dizendo qui o agogô num presto...”
O afoxé vai evoluindo no ritmo encantador do ijexá e na alegria de seus componentes irmanados na liberdade da afirmação de seus valores, através da brincadeira, da troça, “Troça Carnavalesca Pai Buruko”.
As mensagens que aludem à trajetória da luta de liberdade pelos direitos de territorialidade, cantadas em yoruba ou no português dos antigos africanos, atualiza num aqui e agora, a alegria e o prazer de pertencer ao afoxé.
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Marco Aurélio Luz é Elebogi e Oju Oba, integrante da Troça Carnavalesca Pai Buruko. Doutor em Direito do Trabalho e Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela UFRJ, autor do livro Agadá: dinâmica da civilização afro-brasileira, editora UFBA/Pallas. 1995, dentre outros. - maolluz@terra.com.br
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Algumas obras de Marco Aurélio Luz
Agada: Dinâmica da Civilização Africano-Brasileira
Centro Editorial e Didático da UFBA, ISBN 8523201106 (85-232-0110-6)
Cultura Negra Em Tempos Pós-modernos
EDUFBA, ISBN 8523202781 (85-232-0278-1)
Do Tronco Ao Opa Exim: Memória e Dinâmica da Tradição Afro-Brasileira
Pallas, ISBN 8534701660 (85-347-0166-0)
Identidade Negra e Educação
Afoxé, também chamado de Candomblé de rua, é um cortejo de rua que sai durante o carnaval. Trata-se de uma manifestação afro-brasileira com raízes no povo iorubá, em que seus integrantes são vinculados a um terreiro de candomblé. O termo afoxé provém da língua iorubá. É composto por três termos: a, prefixo nominal; fo, significa dizer, pronunciar; xé, significa realizar-se. Segundo Antonio Risério, afoxé quer dizer o enunciado que faz acontecer.
Características
O afoxé tem comportamento específico, seus foliões estão vinculados a diversos terreiros de candomblé. Têm consciência de grupo, de valores e hábitos que os distinguem de qualquer outro bloco. Para quem não conhece o candomblé e suas cantigas, olha como se fosse um bloco carnavalesco diferente, mas é o candomblé de rua, segundo Raul Lody.
As principais características são as roupas, nas cores dos Orixás, as cantigas em língua Iorubá, instrumentos de percussão, atabaques, agogôs, afoxés e xequerês. O ritmo da dança na rua é o mesmo dos terreiros, bem como a melodia entoada. Os cantos são puxados em solo, por alguém de destaque no grupo, e são repetidos por todos, inclusive os instrumentistas. Antes da saída do grupo ocorre o ritual religioso (como a cerimônia do "padê de Exu" feita antes dos ritos aos orixás numa festa de terreiro).
O afoxé Embaixada da África foi a primeira manifestação negra a desfilar pelas ruas da Bahia, em 1885. Em seu primeiro desfile, utilizou indumentária importada da África. No ano seguinte, surgiu o afoxé Pândegos da África.
Ocorrência
Podem ser encontrados no Carnaval da Bahia em Salvador e nas cidades de Fortaleza, Recife, Olinda, Rio de Janeiro, São Paulo e Ribeirão Preto.
Nos anos 1980, havia um grupo em Belo Horizonte, o Afoxé Ilê Odara, fundado por Gilberto Gil e a iyalorixá Oneida Maria da Silva Oliveira, a Mãe Gigi. O afoxé foi extinto e desfilou pela última vez, em Belo Horizonte, no ano de 1988, após a morte de dona Oneida. Desfilavam no grupo mineiro nomes como o cientista político da UFMG Dalmir Francisco, o bailarino Márcio Valeriano e o ex-prefeito de Belo Horizonte, Maurício Campos, além de personalidades da comunidade negra, como a coreógrafa Marlene Silva, o músico Mamour Bá, a bailarina Rosileide Oliveira e o sambista Raimundo Luiz de Oliveira, o Velho Dico. Em Ribeirão Preto, SP, o Afoxé Ómò Orunmila iniciou nos anos 1990 sua participação no Carnaval de Rua local, sob iniciativa do Centro Cultural Orunmilá que tem na cidade entre outras a função de resistência cultural ante as tentativas de dominação da cultura negra pela cultura ociental e de preservação dos laços negros e afrodescentes do carnaval de rua, seus espetáculos e suas agremiações carnavalescas locais.
O ritmo africano Ijexá
Ijexá é uma nação do Candomblé, formada pelos escravos vindos de Ilesa na Nigéria, em maior quantidade na região de Salvador, Bahia.
O Babalorixá Eduardo de Ijexá foi o mais conhecido dessa nação. Como também o Babalorixá Severiano Santana Porto, ambos do mesmo orixá, Logum Edé.
O Ijexá resiste atualmente como ritmo musical presente nos Afoxés.
Dentro do Candomblé é essencialmente um ritmo que se toca para Orixás, Oxum, Osain, Ogum, Logum-edé, Exu, Oba, Oyá-Yansan e Oxalá.
É um ritmo suave, mas de batida e cadência marcadas de grande beleza, no som e na dança. O Ijexá é tocado exclusivamente com as mãos, os aquidavis ou baquetas não são usados nesse toque, sempre acompanhado do Gã (agogô) para marcar o compasso. O Afoxé Filhos de Gandhi da Bahia é talvez o mais tenaz dos grupos culturais brasileiros na preservação desse ritmo.
O Afoxé Filhos de Gandhi basicamente só toca Ijexá e assim ele se mantém vivo. Herança de África, viva aqui na Latinamérica.
Na música popular o ritmo se manifesta em gravações como ¨Beleza Pura¨ de Caetano Veloso, ¨Palco¨ (versão do Acústico Unplugged) de Gilberto Gil, ¨É d´Oxum¨ de Gerônimo e Vevé Calazans, gravada por Gal Costa e por vários outros intérpretes da música brasileira. Presente também em uma música do DVD Jorge Vercilo ao vivo, no qual ele cita o ritmo. Pode se encontrar traços do ritmo em outra canções populares brasileiras, como “O que foi feito de vera, O que foi feito deverá” de Milton Nascimento. Também pode ser encontrado na música “Ijexá”, na voz de Clara Nunes.
Trata-se de mais um ritmo afro presente na cultura local. De origem iorubá, a palavra afoxé poderia ser traduzida como "a fala que faz". Para alguns pesquisadores seria uma forma diversa do maracatu. O termo Afoxé da África denota a festa profano-religiosa efetuada pela nação no momento oportuno. A expressão afoxé teve uso restrito, apenas entre os seus participantes, já que os autores dedicados ao estudo do maracatu não a registram.
Três instrumentos básicos fazem parte desta manifestação. O afoxé (ou agbê), cabaça coberta por uma rede formada de sementes ou contas, é percutido agitando-se a rede, que fricciona no corpo da cabaça. Os atabaques, basicamente de três tipos, com três tamanhos diferentes que em conjunto traduzem o som do ijexá, tocado no afoxé atualmente. O agogô, formado por duas campânulas de metal, com sonoridades diferentes, é quem dita o ritmo aos demais instrumentos.
As melodias entoadas nos cortejos dos afoxés são praticamente as mesmas cantigas ou orôs entoados nos terreiros afro-brasileiros que seguem a linha jexá. O Afoxé, longe de ser, como muita gente imagina, apenas um bloco carnavalesco, tem profunda vinculação com as manifestações religiosas dos terreiros de candomblé. Vem daí o fato de chamar-se o afoxé, muitas vezes, de "Candomblé de rua". Inclusive por homenagear um orixá, geralmente, o orixá da casa de candomblé a que pertence. Em Pernambuco, o afoxé ressurge com o Movimento Negro Unificado no final da década de 70, como uma das formas de se fazer chegar à maioria da população, o debate sobre consciência negra e liberdade
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